quarta-feira, 10 de maio de 2023

Exposição Nise Da Silveira: A Revolução Pelo Afeto

A partir do dia 8 de Dezembro, o Sesc São Paulo traz à capital paulista a mostra Nise da Silveira: a revolução pelo afeto, que celebra e discute o legado da psiquiatra alagoana responsável por uma profunda transformação no campo da saúde mental. A exposição propõe uma experiência a partir de três eixos principais: contexto, dor e afeto, que levanta questões do debate sobre loucura e “normalidade”, assim como pontua o princípio da resistência aos métodos violentos dos hospitais psiquiátricos. Esses ambientes preenchidos por sobreposições que contrastam a frieza da instituição de clausura – sob constante vigilância – com o calor, a humanidade e a liberdade do trabalho que a doutora Nise realizou nos ateliês do Engenho de Dentro, hospital psiquiátrico na capital do Rio de Janeiro, hoje renomeado em sua homenagem. Além de conhecer a trajetória de Nise, condecorada como Heroína da Pátria em 2022 pelo Congresso Nacional, os visitantes do Sesc Belenzinho vão apreciar de perto as obras de emblemáticos artistas do acervo do Museu de Imagens do Inconsciente, como Adelina Gomes, Emygdio de Barros, Carlos Pertrius e Fernando Diniz. Junto a elas, também há produções de artistas contemporâneos como Lygia Clark e Carlos Vergara. Dentre as novidades desta edição da mostra em São Paulo, estão quatro obras de Aurora Cursino dos Santos e três obras de Ubirajara Ferreira Braga, todas do acervo do Museu Osório César. Torna-se fundamental, apresentar essa personagem e sua importância simbólica ontem e hoje. Nise é uma mulher revolucionária e representa um pensamento vanguardista brasileiro na ciência e, pela especificidade de seu trabalho, consequentemente, nas artes.

Sobre Nise da Silveira

Nise da Silveira nasceu em Maceió, no dia 15 de fevereiro de 1905, filha de um professor de matemática e jornalista com uma pianista. Desse modo, cresceu em uma casa que prezava pela cultura e pelo afeto, frequentada por gente da imprensa, estrangeiros e artistas. A futura psiquiatra estudou no Liceu alagoano e, em 1921, foi para a Faculdade da Bahia, em Salvador. Ingressou no curso de medicina aos 15 anos e se formou em 1926, sendo a única mulher entre 157 homens daquela turma. Nessa época, também se casou com o médico sanitarista Mário Magalhães, colega de faculdade com quem viveria até o fim da vida. Juntos, optaram por não ter filhos e, assim, dedicar-se prioritariamente à medicina. Em 1927, já sem a mãe e sofrendo pelo falecimento do pai, Nise decidiu se mudar para o Rio de Janeiro com seu companheiro, pois lá teriam melhores oportunidades de trabalho. No ano de 1933, enquanto finalizava sua especialização em psiquiatria, colaborou com a clínica neurológica de Antônio Austregésilo. Ao concluir essa etapa de formação, foi aprovada em concurso e começou a trabalhar no Serviço de Assistência a Psicopatas e Profilaxia Mental do Hospital da Praia Vermelha. Na década de 1930, militou no Partido Comunista Brasileiro, mas foi expulsa da célula sob a acusação de trotskismo. Seu engajamento levou a uma denúncia por posse de livros marxistas, o que ocasionou a prisão de Nise da Silveira em 1936. Dessa época até meados da década de 1940, permaneceu com o marido em condição semiclandestina, afastada do serviço público. Ao retomar suas atividades, em 1944, foi integrada ao Centro Psiquiátrico Nacional Pedro II, no Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro, onde combateu técnicas agressivas utilizadas nos pacientes da saúde mental.

Nesse contexto, criou ateliês de pintura e modelagem para estimular a vinculação dos sujeitos por meio da expressão simbólica. Assim, tornou-se revolucionária em seu campo de atuação, alcançando resultados reconhecidos internacionalmente pela comunidade médica e científica. Em 1952, Nise fundou o Museu de Imagens do Inconsciente, no Rio de Janeiro, espaço que ainda hoje exerce a função de resguardar o legado da visionária e de ser um centro de estudo e pesquisa que preserva os trabalhos produzidos nos ateliês psiquiátricos. Em 1956, surgiu ainda a Casa das Palmeiras, clínica voltada à reabilitação de antigos pacientes de instituições psiquiátricas. Nesse percurso, a médica também se aproximou dos estudos jungianos das mandalas, uma vez que essas imagens eram recorrentes na produção dos internos que acompanhava. Já em 1954, iniciou uma troca de correspondência com Carl Gustav Jung que resultaria em um diálogo bastante produtivo para seu trabalho. Jung deu importante estímulo a Nise para que ela realizasse uma mostra com a obra de seus pacientes. Assim, em 1957, ocorreu a exposição “A arte e a esquizofrenia”, que ocupou cinco salas do II Congresso Internacional de Psiquiatria, realizado em Zurique. Na ocasião, o mentor da psicologia analítica incentivou Nise a estudar mitologia como forma de ampliar as ferramentas de leitura de seu trabalho. A psiquiatra então embarcou em um período formativo no Instituto Carl Gustav Jung, na Suíça, que ocorreu em duas fases – de 1957 a 1958, e de 1961 a 1962. Ao retornar ao Brasil, criou o Grupo de Estudos Carl Jung, que presidiu até 1968. Nesse mesmo ano, publicou a primeira edição do livro Jung: vida e obra.

Atenta às discussões e pesquisas não só da psiquiatria, mas dos estudos científicos ligados à subjetividade, Nise da Silveira contribuiu para reposicionar o debate sobre internação e tratamento da esquizofrenia. Para isso, incluiu as práticas com materiais expressivos na rotina dos internos que estavam sob sua responsabilidade, observando tanto o modo como manejavam ferramentas artísticas e realizavam suas obras quanto as imagens que surgiam desse trabalho criativo. “A Nise criou um método clínico centrado no afeto. Ela é herdeira de Juliano Moreira, de Baruch Espinoza, de Sigmund Freud, de Carl Gustav Jung. Jung foi aluno de Freud e professor da Nise, na Suíça. Homens revolucionários, que abandonaram a ideia do corpo máquina e trabalharam com a abordagem centrada na subjetividade, na emoção, na identidade, na simbologia, nas narrativas que restauram as memórias. Ainda em vida, Nise da Silveira recebeu diversas homenagens e prêmios, como a Ordem de Rio Branco, pelo Ministério das Relações Exteriores, em 1987; o Prêmio Ciccillo Matarazzo, na categoria Personalidade do Ano, da Associação Brasileira de Críticos de Arte, em 1992; a Medalha Chico Mendes, do Tortura Nunca Mais, em 1993; e a Ordem Nacional do Mérito Educativo, pelo Ministério da Educação e do Desporto, em 1993.  Já aos 94 anos, em 1999, a alagoana veio à óbito devido a uma pneumonia, deixando um imenso legado para humanidade, que nunca será esquecido. Foi no seu tempo, uma mulher revolucionária, que fez de sua trajetória a pioneira e combativa no tratamento psicológico mais humanizado, ela rejeitava a palavra paciente em relação aos internos dos hospitais psiquiátricos, determinava o uso de clientes para reforçar a relação de troca, mas preferia sempre se referir a eles pelos nomes.


SESC BELENZINHO
Período: 8 de dezembro de 2022 a 07 de maio de 2023
Entrada gratuita
Endereço: Rua Padre Adelino, 1000 - Belenzinho, São Paulo 
https://www.sescsp.org.br/

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